quinta-feira, 23 de julho de 2009

A PARAPSICOLOGIA E O PARANORMAL

A PARAPSICOLOGIA E O PARANORMAL

de Christopher C. French


O Jornal de Parapsicologia (1994) define psi como "um termo geral usado como substantivo ou adjetivo para identificar PES ou PC (em inglês)". PES ou percepção extra-sensorial é definida como "a cognição paranormal; a aquisição de informação sobre um evento, um objeto, ou uma influência externa (mental ou física; passada, presente, ou futura) de alguma maneira que não pelos canais sensoriais conhecidos." PSI compreende telepatia (contato direto de uma mente a outra), clarividência (aquisição de informação relacionada com objetos ou eventos remotos), e precognição (conhecimento dos eventos futuros que não seja pela dedução ordinária). PC ou psicocinese é definida como "a ação paranormal; a influência da mente em um sistema físico que não possa ser explicada inteiramente pela mediação de alguma energia física conhecida." A PC é freqüentemente subdividida em micro-PC, definida como "todo efeito psicocinético que requeira a análise estatística para ser demonstrado, e que às vezes é usado para designar a PC que tem como alvo um sistema mecânico quântico", e macro-PC, definida como "todo efeito psicocinético que não requerer a análise estatística para sua demonstração, e que às vezes é usada para designar a PC que tem como alvo um sistema maior do que os processos mecânicos quânticos, incluindo microrganismos, dados e outros objetos maiores."

Dar uma definição precisa ao termo paranormal é problemático, mas em um sentido geral a palavra é usada para os alegados fenômenos que não podem ser explicados em termos de teorias científicas atuais. Alguns investigadores adotam uma interpretação estrita do paranormal incluindo somente PES e PC, mas o termo freqüentemente é usado de maneira muito mais abrangente, incluindo uma variedade de fenômenos tais como o astrologia, OVNIs, rabdomancia, triângulo das Bermudas, caminhar sobre brasas, e assim por diante.

O status científico do psi ainda é debatido acaloradamente (veja, por exemplo, Rao & Palmer, 1987; Alcock, 1987). Os críticos afirmam que a parapsicologia esteve assolada no passado por problemas metodológicos e fraudes ocasionais cometidas por sujeitos ou experimentadores. Evidências recentes, a serem discutidas mais completamente a seguir por Deborah Delanoy, apresentam o maior desafio até hoje para os céticos em relação à realidade do psi, mas a história do parapsicologia envolveu muitos falsos despontares e uma postura de "esperar para ver" as últimas evidências não é completamente insensata. Não há nenhuma dúvida de que se o psi for real, muitos aspectos de nossa visão de mundo científica atual necessitarão ser revisados radicalmente e essa tarefa não deve ser empreendida sem seriedade.

Voltando para as opiniões do público geral, pesquisas de opinião tipicamente revelam um alto nível de crença em fenômenos paranormais. Por exemplo, em uma pesquisa recente, perguntou-se a uma amostra representativa do público britânico suas opiniões relativas a várias alegações paranormais. A porcentagem que indica quantos pensam que uma alegação era verdadeira é dada em cada item:

  • É possível saber o que alguma outra pessoa está pensando ou sentindo mesmo se não estiver em contato por meios ordinários: 63%
  • Os sonhos podem predizer o futuro: 71%
  • Orações às vezes são respondidas: 71%
  • É possível fazer alguém se virar simplesmente olhando para essa pessoa: 66%
  • Algumas pessoas podem recordar vidas passadas que viveram em outros corpos: 54%
  • É possível receber mensagens dos mortos: 37%
  • Algumas casas são assombradas por fantasmas: 69% (Humphrey, 1995, p. 4)

Nada menos que 88% dos participantes concordaram com ao menos uma das afirmações acima. Portanto, aos olhos do público geral, o paranormal é real.

Níveis tão elevados de crença representam um desafio àqueles que duvidam da realidade do paranormal. Não é simplesmente na sociedade ocidental moderna que encontramos níveis elevados de crença. Ao longo da história e em todas as sociedades, encontramos relatos alegadamente verdadeiros de eventos que, se realmente ocorrerem, cabem em nossa definição do paranormal. Textos religiosos tais como a bíblia contêm muitos relatos de milagres, incluindo curas, sonhos premonitórios, e maravilhas psicocinéticas tais como andar sobre a água e transformar água em vinho (mas não ao mesmo tempo). Na Grécia e Roma antigas, muitas formas de adivinhação eram aceitas como guias legítimos para o que o futuro reservava, incluindo a interpretação de entranhas de animais, que fazia muito mais sujeira do que ler folhas de chá e provavelmente era tão eficiente quanto ela. Mesmo hoje, em muitas culturas tradicionais aceita-se que determinados indivíduos com certos dons têm poderes especiais que lhes permitem comunicar-se telepaticamente, obter informações por clarividência e lançar maldições mortais em seu inimigos.

Os críticos do paranormal realmente têm boa justificativa para rejeitar esta crença quase universal no psi? A resposta simples é que no momento nós simplesmente não sabemos se as forças paranormais existem e um enfoque verdadeiramente científico e de mente aberta deve ser tal que permita a possibilidade de que existam. Podemos estar certos, no entanto, de que mesmo se tais forças não existirem, a natureza humana é tal que muitas pessoas ainda acreditariam no paranormal. Isso acontece ao menos em parte por causa das imperfeições na maneira com que processamos informações sobre mundo em torno de nós. Em muitas situações da vida diária, podem ocorrer eventos que muitas pessoas sentem que só poderiam ser explicados pela atuação de forças paranormais mas que na verdade podem ser creditados a fatores físicos ou psicológicos (Alcock, 1981; Blackmore, 1990; French, 1992a; Hines, 1988; Hoggart & Hutchinson, 1995; Zusne & Jones, 1989). Se no fim esse enfoque explicará ou não todas as alegações paranormais só o futuro nos dirá, mas provavelmente é verdade que a maioria dos investigadores sérios em ambos os lados da questão concordariam que a maioria dos eventos que são interpretados em termos paranormais não envolvem psi.

Há alguns anos eu analisei esse tópico e listei as diversas situações que as pessoas freqüentemente interpretam em termos paranormais mas que na verdade não exigem nada parecido (French, 1992a). Eu também considerei a questão de se algumas pessoas poderiam ou não ter mais tendência do que outras aos tipos de distorção no processamento de informação que poderia conduzir a essa interpretação errônea. Isso pode explicar o fato de que as pessoas diferem em termos de seu nível de crença no paranormal. Em um extremo está o cético dogmático que se recusa a aceitar sequer a possibilidade de que as forças paranormais possam existir sem considerar de fato qualquer evidência. No outro, está o tipo de pessoa que aceita qualquer noção paranormal com base na mais frágil evidência. A maioria das pessoas está entre esses extremos. Hoje, eu não pretendo apresentar uma análise completa desta abordagem, mas ilustrar alguns dos fatores que meus colegas e eu consideramos em investigações recentes. Vale a pena indicar que nenhum fator psicológico isolado fornecerá uma explicação completa das experiências e crenças paranormais, dada a vasta amplitude de crenças e experiências paranormais que existem. Entretanto, cada um dos fatores que foram investigados fornece uma peça no quebra-cabeças.

As pessoas são notoriamente ruins em estimar probabilidades (Kahneman, Slovic & Tversky, 1982). Por exemplo, quando perguntadas "quantas pessoas um grupo precisa ter para gerar uma probabilidade de 50% que dois deles tenham aniversário no mesmo dia (independente do ano)?", a maioria das pessoas se surpreende ao saber que a resposta correta é 23. Segue que se as pessoas não avaliarem quão provável é um dado evento em termos puramente aleatórios (por exemplo, um sonho premonitório que se torne verdade), podem relutar em aceitar uma explicação que diga que era somente uma coincidência e preferir uma explicação paranormal. Caroline Watt abordará mais tarde a psicologia das coincidências com alguma profundidade ainda hoje, mas eu gostaria de fornecer apenas uma poderosa ilustração da relevância da coincidência em explicar eventos aparentemente paranormais.

O matemático John Allen Paulos (1990) ilustra o fato de que devemos esperar muitos relatos de sonhos aparentemente "premonitórios" todos os anos por efeitos puramente aleatórios. A bem da nossa argumentação, suponhamos que se defina um sonho como "aparentemente premonitório" caso a probabilidade de o sonho corresponder a algum evento futuro seja de uma em 10.000. Certamente, qualquer um de nós ficaria impressionado se tivesse esse sonho. Novamente, simplifiquemos as coisas supondo que cada pessoa tem um sonho por noite (na verdade, temos muito mais). A probabilidade de que nenhum sonho seja aparentemente premonitório é alta (0,9999). A probabilidade de que, em um ano inteiro, não se terá um sonho que pareça predizer o futuro é dada por

0,9999 x 365 = 0,9642 (aproximadamente)
ou seja, mesmo em um ano inteiro é provável que você não tenha esse sonho. Mas perto de 3,6% da população terá ao menos um sonho assim! Isto acontece com 9 milhões de pessoas, somente nos EUA. Além disso, qualquer pessoa, em um período de 19 anos, terá uma chance um pouco maior que 50% de ter esse sonho. Mesmo se você pensasse que 1 em 10.000 é um número alto demais, e optasse para probabilidades de 1 em 100.000 antes de classificar um sonho como "premonitório", você ainda teria 900.000 relatos por ano nos EUA, sem nenhuma necessidade de invocar qualquer poder psíquico. É claro que, na verdade, é provável que outros fatores não-paranormais estejam freqüentemente envolvidos quando se tem sonhos aparentemente premonitórios - por exemplo, sonhar com a morte de parentes idosos quando já se sabe que estão doentes.

Um outro fator que pode levar as pessoas a recorrer desnecessariamente a uma explicação paranormal são os alegados médiuns que as enganam usando técnicas de mágica profissional. Singer e Benassi (1981) relatam uma série de estudos em que um mágico amador executou vários truques em aulas de introdução à psicologia. Independentemente de o artista ter sido apresentado em um tom cético como um suposto médium ou como mágico amador, três quartos dos alunos acreditaram fortemente que o indivíduo era médium. Em estudos posteriores, a maior parte dos sujeitos pensou que o artista era um médium depois de terem sido apresentados de maneira neutra. Quase todos os sujeitos concordaram que mágicos podiam executar os mesmos truques. Eles também concordaram que a maioria das pessoas que faziam esses truques provavelmente eram mágicos ou charlatães, e não médiuns verdadeiros. No entanto, ao serem perguntados se gostariam de mudar de opinião em relação à apresentação à luz de suas próprias afirmações, novamente firmaram que o mágico era médium.

Lembremos o incidente que envolvendo James ("The Amazing") Randi como testemunhado pelo psicólogo James E. Alcock:

Randi tinha um show em que executava todos os bem conhecidos feitos de Geller, explicando que aquilo que as audiências viam eram truques mas que Geller, ao fazer as mesmas coisas, afirma que atuam poderes paranormais. No meio da apresentação extremamente habilidosa de Randi, um espectador (que se descobriu ser um professor universitário) se levantou com raiva e em altos brados denunciou Randi como uma fraude. Randi respondeu que certamente era uma fraude, que tudo ele fez, como afirmou diversas vezes, era feito com truques. Mas o homem não se calou facilmente; ele afirmou que Randi era um fraude porque usava de fato poderes psíquicos, mas escondia este fato do público! (Alcock, 1981, p. 59).
Richard Wiseman e Robert Morris (1995) recentemente apresentaram evidências que sugerem que aqueles que crêem podem ter uma memória mais deficiente para o que realmente ocorre durante uma demonstração "pseudo-mediúnica" (isto é, mágica) e tenham maior tendência a ver na demonstração o envolvimento de forças paranormais.

Uma técnica particular que é popular com pseudo-paranormais é conhecida como "leitura fria". A leitura fria pode ser usada para dar a impressão de que se pode saber qualquer coisa sobre um completo desconhecido (Dutton, 1988; Hyman, 1977; Roe, 1995). Obviamente, essa técnica pode ser explorada para convencer pessoas que alguém tem poderes paranormais. Há muitas dicas que podem ser usadas para descobrir muitos dados sobre as pessoas antes que digam qualquer coisa - idade, sexo, roupas, jóias, cabelo, e assim por diante. Quem executa uma leitura fria, seja paranormal, astrólogo, quiromante, ou o que quer que seja, tem um olho treinado para esses detalhes. Uma vez que a consulta começa, entretanto, quem faz a leitura pode rapidamente se aprofundar na área de interesse e dizer ao cliente todo tipo de coisa que aparentemente não poderia saber sem poderes paranormais. Na verdade, lê-se dados sutis no cliente, tais como mudanças na postura, no tom da voz e na respiração para habilidosamente concentrar-se nas áreas de maior interesse do cliente. Através de uma delicada mistura de chutes inteligentes e do retorno de informações que na verdade foram fornecidas pelo cliente, freqüentemente se pode criar uma ilusão poderosa de que a pessoa que faz a leitura esteja de realmente em contato com alguma fonte paranormal de conhecimento.

É uma questão irrelevante saber em que grau os auto-proclamados paranormais exploram deliberadamente as técnicas da leitura fria, em oposição ao uso inconsciente e a crença real de que realmente possuem um dom paranormal especial. Entretanto, o que é absolutamente certo é que a técnica pode ser usada muito eficazmente por quem não faz nenhumas alegação sobre tais dons.

Um aspecto da leitura fria que recebeu muita atenção dos psicólogos é um fenômeno conhecido como efeito Barnum. Ele se relaciona à tendência de que as pessoas vejam indicações vagas, ambíguas e gerais como descritivas de suas personalidades individuais (para análises do fenômeno, veja Dickson & Kelly, 1985; Furnham & Schofield, 1987; Snyder, Shenkel, & Lowery, 1977). Este perfil Barnum típico ilustra o poder dessa técnica (imagine que você recebeu de um vidente ou astrólogo essa descrição de si mesmo):

Você tem uma grande necessidade de que as pessoas gostem de você e o admirem. Você tende a ser muito crítico de si mesmo. Você tem muitas capacidades não utilizadas que não utilizou para si mesmo. Apesar de alguns problemas de personalidade, você geralmente consegue compensar isso. Disciplinado e auto-controlado exteriormente, você tende a ser preocupado e inseguro internamente. Às vezes você tem dúvidas sérias sobre se tomou a melhor decisão ou fez a coisa certa. Você prefere uma certa mudança e variedade e fica descontente quando cercado por restrições e limitações. Você se orgulha de pensar por si e não aceita idéias de outros sem prova satisfatória. Você percebeu que é pouco sábio ser franco demais ao revelar-se aos outros. Às vezes você é extrovertido, afável e sociável, e em outras você é introvertido, receoso e reservado. Algumas de suas aspirações tendem a ser bem pouco realistas. A segurança é um de seus objetivos principais na vida (Forer, 1949).
Muitas experiências aparentemente paranormais envolvem tentar encontrar correspondência entre duas fontes de informação ricas e complexas. Um exemplo são os clientes que escutam leituras de videntes ou astrólogos e que tentam entendê-las a partir dos eventos em suas próprias vidas. Neste caso, as fontes de informação são, por um lado, a própria leitura, que é tipicamente vaga, divagante e prolixa, e por outro lado, o rico tecido de uma vida humana. Não é de se espantar que as correspondências possam ser encontradas se o cliente estiver inclinado a procurá-las. Marks e Kammann (1980) cunharam a expressão 'validação subjetiva' para essa tendência de encontrar correspondências entre estímulos não relacionados: "isso ocorre quando dois eventos não relacionados são percebidos como relacionados porque uma opinião, uma expectativa, ou hipótese exige ou requer um relacionamento" (p. 24).

Marks e Kammann (1980) criaram a expressão originalmente para um efeito interessante que observaram quando realizavam estudos sobre visão remota. Outros investigadores (por exemplo, Targ & Puthoff, 1974) tinham relatado que a técnica de visão remota produzia evidências confiáveis da transmissão paranormal de informação. Um estudo típico de visão remota envolve uma pessoa, o agente ou o "emissor", visitando um número de locais aleatoriamente selecionados (por exemplo, um parque, uma ponte, uma estação de trem, etc.) e tentando transmitir telepaticamente a informação a uma outra pessoa, o "receptor", que se encontra no laboratório. Em instantes predeterminados, quando o emissor estava nos alvos selecionados, o receptor descreveria todas as imagens mentais e as impressões que estava recebendo e o experimentador gravaria e transcreveria tudo que foi dito. Essas transcrições seriam então fornecidas aos juizes independentes que visitariam os locais e avaliariam o grau de correspondência entre cada transcrição e local.

Marks e Kammann (1980) não encontraram nenhuma evidência para PES e apresentaram fortes evidências de que o sucesso de estudos precedentes era provavelmente devido às falhas na metodologia empregada. Eles observaram, contudo, que os juizes independentes, ao visitar os locais após a experiência, às vezes ficavam muito entusiasmados com alguma correspondência entre detalhes nas transcrições e na cena que está sendo visitada. Mas se verificou que no fim das contas, entretanto, a transcrição geralmente não era a que tinha sido produzida quando o agente visitava aquele lugar. Ou seja, a correspondência era somente o resultado de tentar encontrar correspondências entre dois estímulos muito complexos - a transcrição e o lugar. Essa situação foi bem descrita por Scott (1988, p. 322):

Uma única transcrição tipicamente inclui pontuações de afirmações, e no outro lado uma localização-alvo contém um grande número de objetos, formas, vistas, sons e associações. A chance de encontrar uma correspondência impressionante em algum lugar em tamanha massa de dados é grande - e mais importante, muito maior do que parece ser a um observador desatento. Marks e Kammann (1980) descrevem o fenômeno que chamam de 'validação subjetiva', que leva o observador a procurar correspondências entre a transcrição e o alvo e, quando os encontra (como, quase inevitavelmente, acontecerá), a negligenciar o tamanho do conjunto original de comparações a partir das quais as correspondências bem sucedidas foram selecionadas.
Deve-se notar agora que um estudo de visão remota bem conduzido seria realmente imune às tendenciosidades que surgem em conseqüência desta tendência humana de encontrar correspondências entre dois estímulos complexos e supostamente relacionados. De fato, os estudos de visão remota continuaram a ser realizados depois das críticas de Marks e Kammann (1980) e constituem atualmente um dos enfoques que os parapsicólogos sentem que fornece forte evidência para a realidade do psi (veja por exemplo, Utts, 1995a, 1995b; Hyman, 1995). Estejam eles certos ou não, meus colegas e eu estávamos interessados na possibilidade de usar a técnica da visão remota como um disfarce para investigar possíveis diferenças entre os crentes e os descrentes no paranormal.

Em três experiências, realizadas em colaboração com Dominique Herrmann, Sandra Hales e Charlotte Northam, pediu-se que crentes e descrentes no paranormal avaliassem as evidências obtidas aparentemente das experiências de visão remota. Os indivíduos imaginavam julgar o grau de correspondência entre conjuntos de fotografias dos locais visitados por um emissor telepático e por transcrições das descrições desses locais produzidas por um receptor telepático. Na verdade, todas as transcrições foram produzidas pelos experimentadores e assim o grau de correspondência estava sob controle experimental. Crentes avaliaram o grau de correspondência e a probabilidade de que havia PES operando em níveis mais altos do que descrentes, mesmo quando toda a correspondência entre fotografias e transcrições era completamente espúria, porque as transcrições foram associadas a conjuntos de fotografias completamente diferentes. Na última experiência, descobriu-se que esse efeito se aplicava somente quando os crentes estavam com a impressão de que a transcrição estava relacionada ao alvo real, e não quando lhes era informado que a transcrição pertencia a um controle incluído para finalidades da comparação. Nós realizamos a última experiência a fim de investigar a possibilidade de que os crentes simplesmente vêem mais correlações do que descrentes entre dois estímulos, independentemente de terem ou não sido levados a acreditar que os estímulos estavam ligados psiquicamente de alguma maneira. O trabalho anterior de Richard Wiseman e Matt Smith (1994) tinha apoiado somente essa possibilidade e as razões para a aparente discrepância entre nossas descobertas e as dele ainda não são muito claras.

Uma outra situação geralmente é mal interpretada como revelando o envolvimento de poderes paranormais, embora não seja o caso, é a demonstração de estereótipos da população. Caso se diga a um grupo de sujeitos que um número, por exemplo entre um e dez, deve lhes ser transmitido telepaticamente e que devem escrever o primeiro número que lhes vier à mente, suas respostas estarão longe de uma distribuição aleatória. Na verdade, "7" será de longe a resposta mais popular, não obstante o número que o "emissor" tinha em mente. Efeitos similares são encontrados usando outros tipos de alvo (por exemplo, para um "desenho de linhas simples", uma minoria significativa dos sujeitos desenhará uma casa). Esses efeitos foram explorados por Uri Geller, entre outros, para dar a impressão de que forças psíquicas estão atuando quando na verdade não estão.

Embora o efeito básico em si seja bastante confiável, não está claro se os crentes no paranormal são mais inclinados do que descrentes a responder na linha dos estereótipos em tais situações. Pesquisas sobre esse assunto até hoje produziram um conjunto heterogêneo de resultados (por exemplo, Marks & Kammann, 1980; Grimmer & Branco, 1986; Rigby, 1989; French, 1992b). Esse efeito é intuitivamente plausível. Se algumas pessoas tendem a pensar de maneiras mais estereotípicas, encontrarão mais freqüentemente outras pessoas dizendo exatamente o que elas pensavam e podem consequentemente ser mais inclinadas a acreditar em telepatia. A partir dos resultados heterogêneos das pesquisas anteriores e de um estudo piloto bem sucedido com 135 assuntos no qual os crentes de fato demonstraram mais respostas estereotípicas do que os descrentes, Susan Blackmore e eu recentemente coletamos dados de uma amostra bastante grande graças ao programa Tomorrow's World, da BBC. Um ator fazia o papel de médium. Disseram aos espectadores que ele estava tentando transmitir um número inferior a 50 com dois dígitos ímpares diferentes. "Ele pode estar pensando em 15 - um e cinco são ambos ímpares - mas não em 11 - um é impar, mas os dígitos são iguais." Tipicamente, aproximadamente um terço de uma audiência produzirá "37" em resposta a estas instruções, que é o resultado que obtivemos de quase cinqüenta mil pessoas que telefonaram. Caso alguém ache que nosso ator pode realmente ter sido paranormal e causado esse enorme pico na distribuição da resposta, nós lhe dissemos para se concentrar em "19", que previsivelmente foi escolhido por poucas das pessoas que ligaram. Nós também obtivemos uma diferença altamente significativa entre crentes e descrentes em termos do grau a que tenderam a produzir a resposta estereotípica. Infelizmente, ela estava no sentido oposto à predição! Eu agradeceria quaisquer sugestões de explicação. Claramente, mais pesquisas são necessárias.

Ambos os exemplos discutidos relacionam-se ao que poderíamos chamar de tendenciosidade no processamento (ou cognitiva) de informação, mas não há nenhuma dúvida que outros fatores psicológicos também são importantes nas causas de crenças no paranormal. Uma enorme quantidade de pesquisa foi destinada a procurar diferenças de personalidade entre crentes e descrentes e foram encontrados resultados interessantes (veja Irwin, 1993), embora novamente uma revisão completa seja impossível no tempo disponível. Michael Thalbourne e Peter Delin (1994) recentemente propuseram uma hipótese interessante na tentativa de esclarecer um padrão de correlações que é encontrado repetidas vezes na literatura. A crença no paranormal está significativamente correlacionada com a criatividade, a tendência a experimentar estados místicos, e diversos graus de psicopatologia. Thalbourne e Delin discutiram que um único fator, que denominam "transliminaridade", pode estar subjacente a essas associações. Segundo eles (p. 3):

[...] nós interpretamos isso como uma medida da extensão a que o conteúdo de alguma região preconsciente (ou "inconsciente" ou "subliminar") da mente consegue cruzar a fronteira para a consciência (no sentido de estar consciente de alguma coisa). Lá eles podem formar a base de crenças no paranormal, experiências de fenômenos aparentemente mediúnicos, alguns aspectos da criatividade, experiência místicas, e sintomas semelhantes a psicoses. Um alto grau de transliminariedade parece implicar uma suscetibilidade em grande parte involuntária, e também uma consciência, de grandes quantidades de fenômenos psicológicos gerados internamente de tipo ideativo e afetivo. Seus similares incluem experiências religiosas, interesses na interpretação de sonhos, e tendência a alucinações.
Deve-se notar que a hipótese de Thalbourne e Delin é essencialmente neutra com relação à questão de se as experiências aparentemente paranormais envolvem ou não forças verdadeiramente paranormais. Pode ser que os indivíduos com um grau elevado de transliminariedade simplesmente não consigam distinguir entre a realidade e o produto de suas próprias mentes e seus relatos de eventos paranormais podem não refletir nenhuma realidade objetiva. Por outro lado, pode ser que o psi realmente exista e que este tipo de indivíduo tenha uma probabilidade particularmente alta de experimentá-lo.

Diversos trabalhos recentes consideraram a importância da infância no desenvolvimento das crenças paranormais com uma ênfase especial na característica da personalidade de tendência à fantasia (por exemplo, Irwin, 1992, 1993; Lawrence, Edwards, Barraclough, Church & Hetherington, 1995). Os indivíduos com tendência à fantasia gastam grande parte de seu tempo com elas, têm imaginação particularmente vívida, e são excelentes sujeitos para a hipnose (Lynn & Rhue, 1988; Wilson & Barber, 1983). Mostrou-se que a tendência à fantasia está correlacionada com nível de crença no paranormal e experiência pessoal com eventos aparentemente paranormais (por exemplo, Irwin, 1990, 1991; Lawrence e outros, 1995; Myers & Austrin, 1985; Rao, 1992; Wilson & Barber, 1983).

Wilson e Barber (1983) notaram uma elevada incidência de traumas de infância, variando do abuso físico a condições de vida instáveis, nos indivíduos com tendências à fantasia. Um terço dos indivíduos com tendência à fantasia relataram traumas de infância sem comparação com nenhum grupo de controle. Um terço deles relatou traumas de infância comparado a nenhum dos respectivos indivíduos do de controle. Embora se reconheça que a tendência à fantasia pode se desenvolver simplesmente em conseqüência do incentivo a fantasiar de um adulto importante na vida da criança, o trauma de infância é largamente considerado um grande antecedente de desenvolvimento. É possível que tais fantasias ofereçam fuga de uma situação aversiva (Lynn & Rhue, 1988; Rhue & Lynn, 1987).

Essa idéia foi apoiada por Harvey Irwin (1992), que relatou uma correlação marginal significativa entre índices de medida de crença no paranormal (Tobacyk, 1988) e uma medida de abuso durante a infância (Council & Edwards, 1987). Irwin (1993) propôs um modelo das origens e funções da opinião paranormal em que a tendência à fantasia tem uma papel central. Em seu modelo, a tendência à fantasia pode se desenvolver em conseqüência do incentivo à fantasia na infância ou em conseqüência de experiências traumáticas na infância. No segundo caso, essa tendência seria mediada pela necessidade de uma sensação de controle. Um estudo posterior de Lawrence e outros (1995) apoiou a associação estatística entre trauma na infância, fantasia infantil, e crenças e experiências paranormais, embora eles tenham sugerido pequenas modificações ao modelo original de Irwin.

Os estudos de Irwin, Lawrence e colegas se basearam nos relatos em retrospecto de abuso na infância dos adultos, obtidos geralmente por questionário. Há ao menos duas maneiras em que esse método poderia produzir resultados inválidos. Pode ser que os indivíduos classificados como inclinados à fantasia sejam simplesmente mais honestos. Podem estar dispostos a admitir uma vida rica em fantasias mesmo que tal admissão possa deixá-los abertos à acusação de serem "meio estranhos" em nossa sociedade. Similarmente, professar uma opinião em vários fenômenos paranormais e admitir ter tido experiências paranormais pode levar um indivíduo ao risco de ridículo. Finalmente, não é necessário dizer que, de maneira geral, pessoas que sofreram abuso na infância podem ter várias razões para não querer divulgar essa informação mesmo em um questionário anônimo. Novamente, é possível que somente os indivíduos muito honestos admitam esse abuso.

Da mesma maneira, existe também a possibilidade de que os indivíduos com tendência à fantasia estejam relatando os incidentes do trauma na infância e experiências paranormais que não ocorreram em qualquer sentido objetivo. Segue da definição de tendência à fantasia que tais indivíduos às vezes experimentam dificuldades no monitoramento das fontes (Johnson, Hashtroudi, & Lindsay, 1993), confundindo eventos que foram fantasiados com a realidade. Certamente, essas questões estão no centro da controvérsia atual sobre falsas memórias (veja, por exemplo, Loftus, 1993).

Eu realizei recentemente um estudo em colaboração com Michael Kerman (French & Kerman, submetido) que evitou esses problemas comparando um grupo de 23 adolescentes que eram conhecidas vítimas sabidas de traumas na infância, tendo experimentado abuso sexual, físico e/ou emocional durante o início da infância, com uma correspondente amostra de controle. Os adolescentes no grupo que sofreu abuso foram recrutados de três unidades de tratamento de adolescentes e aqueles no grupo de controle foram recrutados de três escolas diferentes, em todos os casos com o consentimento de comitês éticos relevantes e dos tutores dos indivíduos. Os grupos foram cuidadosamente correlacionados em idade, sexo, inteligência verbal, religião e origem étnica. Como previsto, o grupo que sofreu abuso teve índices significativamente mais altos em medidas da tendência de crença no paranormal e tendência à fantasia. Os resultados de nosso estudo consequentemente sugerem que as conclusões dos estudos precedentes, baseados na memória dos indivíduos, que mostram correlações entre trauma na infância, tendência à fantasia e a crença no paranormal são de fato válidas e este é um caminho que deve ser cuidadosamente explorado na pesquisa futura.

Há muitos tipos de alegações paranormais que eu não abordei nesta apresentação simplesmente devido às limitações de tempo. Há explicações não-paranormais disponíveis para todos os tipos de alegação paranormal que se pode pensar. Isso não significa necessariamente que explicações não-paranormais estão sempre certas e é essencial que ambos os lados do debate forneçam evidência empírica para apoiar seus argumentos. Diversos outros tipos de alegação paranormal serão considerados por outros membros no painel de apresentações de hoje. Muitas pessoas estão convencidas que o psi é real por causa das alegações dos médiuns, desde o dobrador-de-colher Uri Geller até detetives paranormais, tais como Nella Jones e Chris Robinson. Como será discutido por Richard Wiseman, há muitas explicações não-paranormais para tais alegações que devem ser excluídas antes que se possa declarar paranormalidade genuína. Susan Blackmore discutirá os estranhos estados de consciência que podem estar envolvidos em muitos tipos de experiência paranormal, de visões de fantasmas às alegações de raptos por ETs. Caroline Watt descreverá como nossa inabilidade em estimar probabilidades com precisão freqüentemente nos leva a buscar uma explicação paranormal quando, na verdade, a coincidência é uma explicação completamente adequada. Deborah Delanoy e Robert Morris considerarão a área que tem o maior potencial para convencer céticos como eu de que realmente pode haver algo em alegações paranormais que não pode ser explicado; essa área é parapsicologia experimental.

Além de ter seu próprio interesse, esta área de estudo tem algum significado mais amplo? É muito fácil, em especial para cientistas, desconsiderar crenças paranormais e classificá-las como triviais e não dignas de consideração séria. Eu acredito que este seja um sério erro. Crenças paranormais são encontradas em várias formas em todas as culturas do mundo. São claramente de importância universal aos seres humanos. Pode ser que as forças psíquicas realmente existam. Uma prova disso seria a descoberta mais grandiosa de todos os tempos. Ou pode ser, cruamente falando, que as experiências paranormais sejam nada mais do que nossas mentes nos pregando peças. Eu duvido que os tipos de distorção cognitiva que discuti oferecerão qualquer coisa próxima de uma explicação completa para o desenvolvimento e manutenção das crenças no paranormal, mas podem ser um componente importante. Por que essas distorções se desenvolveram? Com certeza seria melhor em termos evolucionários se nossos sistemas cognitivos não fossem inclinados de maneira nenhuma a tais distorções? A universalidade das distorções sugere o contrário, que elas na verdade conferem alguma vantagem à espécie humana em termos de nossa sobrevivência. Um sistema cognitivo que seja rápido e geralmente correto é provavelmente de maior valor do que um que é muito mais lento mas está correto um pouco mais freqüentemente.

Faria sentido em termos evolutivos que os seres humanos desenvolvessem sistemas cognitivos que pudessem detectar prontamente no ambiente padrões e regularidades, causas e efeitos. O fato de que as pessoas alegam detectar regularidades mesmo quando submetidas a genuína aleatoreidade, ou de que as pessoas freqüentemente percebem relacionamentos causais onde eles não existem, pode ser um preço pequeno a pagar de uma perspectiva evolutiva (French, 1993, p. 195).
Se tais especulações estiverem corretas então o estudo da distorção subjacente às crenças paranormais, possivelmente a maior de todas as ilusões cognitivas, poderia ajudar a lançar uma boa luz sobre a verdadeira natureza da nossa espécie.

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